Aquela temporada vitoriana de 1969/70, apesar de satisfatória, estava longe da excelência anterior em que nas bocas dos adeptos andou, por muitas vezes, a palavra título, ainda que nunca chegasse.
Na seguinte, o Vitória, apesar de andar na parte alta da tabela nunca pôde sequer sonhar com esse feito, ainda que fosse capaz de manter-se sempre entre os seis primeiros, ao contrário do seu vizinho e eterno rival, SC Braga, que nesse exercício viveu atormentado com a possibilidade de cair no cadafalso da despromoção.
Assim, quando se chegou aquela 22ª etapa de um campeonato de 26 jornadas, naquele dia 15 de Março de 1970 que marcava o encontro entre as duas equipas, os estados de espírito não poderiam ser mais diferentes. Com efeito, se de um lado se sonhava com novo apuramento europeu, do outro a derrota poderia ser sinónimo de descida de divisão, de retrocesso.
Por isso, em Guimarães tudo se preparou para o jogo. Até ao ponto de se realizar um cortejo fúnebre, com um caixão a simular o desdito adversário, e com um adepto vestido de padre. Um acto simbólico que fez com que a urna ficasse depositada junto da então bancada lateral (hoje Nascente) e que fez com que o Comércio de Guimarães da data qualificasse a partida como "Um derby inquietante.", e repudiasse tais actos escrevendo que "Lamentável, ainda, no final, certas exteriorizações de certos sectores a oferecerem a ideia de menosprezo pelo adversário. A ética desportiva impõe outros princípios. Consola-nos a certeza que o brio dos atletas e a dignidade dos bons vimaranenses não foram afectados."
Porém, mais do que o acto de picardia, a equipa constituída por Rodrigues; Costeado, Manuel Pinto, Joaquim Jorge, Silva; Artur, Peres, Osvaldinho; Zezinho, Mendes e Manuel, a equipa vitoriana triunfaria por duas bolas a zero, graças ao bis de Zezinho, numa partida em que "o Vitória demonstrou superioridade técnica.", que quase condenou o adversário ao destino que haveria de encontrar semanas depois... o da despromoção.
Acresce ainda que, se estes factos poderão ser comprovados, haverá outros deste dia que serão uma espécie de mito urbano enleado em verdade. Poderão ter acontecido... ou não! Assim, bracarense de nascimento e braguista confesso, o Governador-Civil Santos da Cunha, que tanta indignação gerava em Guimarães por "tudo puxar para Braga", resolveu não se deslocar à Cidade-Berço para, in loco, assistir à partida. Ficaria a ouvir o relato em casa no inesquecível Quadrante Norte, sofrendo pelo clube do seu coração... e dando ordens à sua mulher, religiosa dos sete costados, para se agarrar ao Terço e rezar à santa da sua devoção pelo clube bracarense.
Porém, nada lhe sairia como o projectado, começando a duvidar da eficácia das rezas quando Zezinho, ainda em fase precoce da partida, abriu o activo. Contudo, incentivou a cônjuge a permanecer nos seus ditames religiosos com mais convicção, que só os Santos poderiam salvar a sua equipa... até que, perto do final da partida, o segundo golo fê-lo duvidar da fé da mulher e questionou-a, irado a quem estava a rezar.... Devota da Senhora da Penha, a resposta deixou-o siderado: " Raios te parta mulher... essa não que é deles... ao menos lembravas-te do Bom Jesus ou da Senhora do Sameiro!" E assim, o Vitória dava um passo rumo a mais um apuramento europeu e o rival ficava com a certeza que o caixão que vira depositado durante a partida iria servir para depositar as suas hipóteses de sobrevivência...