Incidentes nos desafios com o FC Porto, infelizmente, serão prática corrente.
Na verdade, o espírito bairrista vitoriano nunca admitiu, nem jamais admitirá, algumas atitudes perpetradas por quem chega a Guimarães imbuído de um espírito que em nada se coaduna com os valores de respeito pela equipa da casa.
Bastará lembrar-nos do ano de 1995 e daqueles tristemente célebres incidentes que quem os viveu ainda os tem na memória. Ou, do episódio de Marega, mais recentemente.
Mas se dissermos que estes desentendimentos começaram muito além, no longínquo ano de 1944, o que diriam? E se acrescentarmos que o Vitória foi punido com um pesado castigo de dez jogos do Campo da Amorosa? Certamente, perceberão que, como sempre, a justiça desportiva afadigou-se em punir os mais fracos, protegendo os, teoricamente, mais fortes.
Comecemos a contar a história. Depois do Vitória ter vencido (mais uma vez!) o Campeonato Distrital de Braga e, por isso, ter conquistado o direito a participar no Campeonato Nacional, estreou-se na prova maior do futebol português com um triunfo por duas bolas a uma, com golos de Ferraz e de Miguel, frente à Olhanense.
Seguia-se a contenda, disputada a 09 de Dezembro de 1943, novamente, na Amorosa, frente ao FC Porto. Porém, o jogo seria tudo menos pacífico.
Assim, ainda que ressalvando o tradicional proteccionismo da imprensa aos clubes que já sabemos, esta fala de um Vitória a jogar nos limites da agressividade, intimidando o adversário. Fora do campo, os adeptos vitorianos criaram um ambiente hostil para o adversário, sendo que o comboio em que estes viajavam terá sido apedrejado.
Contudo, como sempre, esta era a versão parcial da imprensa nacional. Comparemos com o que foi escrito no Notícias de Guimarães: "o FC Porto na ânsia de conseguir um triunfo com que contava de antemão e incitado por numerosa falange de apoio tão entusiasta, que por certo lhe fez esquecer que estava em terra estranha, enveredou a certa altura por uma forma de jogo feia, no que foi seguido pelos vimaranenses, que se deixaram contagiar...”
Apesar da tristeza da situação, recorreremos novamente à Gazetilha do Notícias de Guimarães de 20 de fevereiro de 1944, escrita em tom sátiro e burlesco por Belgatour:
“No domingo que passou
A Cidade registou
Desusado movimento.
Foi-lhe dado pela bola
Que pôs muita gente tola,
falheira de entendimento!
P’ra servir de apoio ao Porto,
veio muito tipo torto,
atrevido e arrogante;
sujeitos que até julgaram
que Guimarãis conquistaram,
legislando a seu talante.
Depois... beberam à larga,
deram furiosa carga
no “verdasco” cá da terra.
Claro está! Com tal calor
excederam-se no ardor,
soltando gritos de guerra...
Palavra puxa palavra,
ao vinho ninguém o trava,
e a coisa teve importância,
porque pessoas de cá
quiseram por às de lá
travões em sua arrogância.
O pior foi que o Vitória,
sem qualquer culpa na história,
é que ficou a perder...
Portanto, que os exaltados
Atentem nos resultados,
- Saibam ouvir e sofrer!”
Posteriormente no mesmo jornal, depois do Vitória ter sido exemplarmente, mas injustamente, punido com 5 jogos de interdição do seu recinto, foi referido que a Federação Portuguesa de Futebol se baseara em factos inexactos, além de que o que “se passou fora do seu terreno não lhe coube culpa alguma, pois nada fez que à luz da razão e da imparcialidade pudesse comportar tão rude castigo.”
Era o primeiro passo de uma rivalidade com mais de 80 anos...