Nas Histórias Críticas, por respeito ao Vitória, que é o que nos move, procuramos sempre retratar todas as cambiantes dos acontecimentos. Sendo que, por vezes, não são tão "cor de rosa" como a nossa imaginação criou, ou, simplesmente, porque a crueza da verdade mancha as deleitosas recordações que o nosso subconsciente pretendeu criar.
Tal sucedeu com o primeiro jogo disputado no actual estádio vitoriano, o D.Afonso Henriques, mas que na altura, ainda, era pertença da autarquia. Tal marcante momento ocorreu faz hoje, 03 de Janeiro de 2023, rigorosamente, 65 anos.
Com efeito, numa partida frente ao Belenenses, para a história ficou o primeiro onze que, orientado pelo argentino José Valle, desceu da Amorosa (por não existirem balneários no novo recinto) para vencer o Belenenses por duas bolas a uma: Roldão; Mário, Daniel; João da Costa, Manuel Pinto, Artur; Castro, Peres, Eduardo, Inácio e Mendes. Quanto a golos, caberia a Castro, a honra de apontar o primeiro tento na nova casa, sendo o segundo que foi sinónimo do triunfo por duas bolas a uma, autoria de Inácio que, nessa época, tinha trocado a Olhanense pelos Conquistadores.
Porém, o momento que poderia ter sido de suprema alegria não o foi. Não o foi, porque como escreveu Fernando Roriz, que viria a ser presidente do Vitória poucos anos depois, "cremos que a nenhum vimaranense deixou de magoar aquele triste espectáculo do passado Domingo. E não foram apenas os prejuízos materiais e desportivos que a prematura utilização do Estádio impôs à cidade e ao futebol, a razão dessa mágoa, Talvez mais do que eles, feriu-nos a obrigação de abrir as portas de uma casa sem beleza, sem comodidades, numa feição de emergência que podia parecer um motivo de culpa e de desleixo para quem nenhuma culpa teve e nunca deixou de lutar tanto quanto era humanamente possível".
Na verdade, naquele dia 03 de Janeiro, o estádio ainda era uma sombra do que viria a ser, mas por uma súbita imposição da Direcção-Geral dos Desportos que obrigava as equipas que recebessem outras que já actuassem em campos relvados a oferecerem iguais condições, o Vitória viu-se envolvido num contra-relógio que fez com que estreasse o estádio, tendo ele, apenas, uma pequena bancada em cimento e uns camarotes em madeira. Tal deveu-se à "intransigência confirmada a dois escassos dias de Domingo e quando esperávamos ainda, naturalmente, que as nossas razões fossem ouvidas, respondemos com o brio vimaranense, essa virtude que não consente a derrota".
Atento a esses factos, segundo Fernando Roriz, "doeu a cada vimaranense, aquele dia. Mas deve ter doído principalmente aos homens que ali verteram o calor do seu bairrismo, a tenacidade do seu carinho por uma das mais caras aspirações vimaranenses."
Porém, como concluía, "soubemos responder naquele triste dia de Domingo. E agora, daqui em diante, continuaremos, decerto esta resposta à maneira de Guimarães".
O Vitória já tinha estádio, uma velha pretensão, mas longe do que desejara e do que projectara...ainda haveria de demorar muitos anos, mas este dia, há 59 anos, foi a primeira vez que aquele recinto "viu" evoluir as camisolas brancas com o Rei nelas bordado...