COMO MANUEL JOSÉ LIDOU COM ARMINDO NO BANCO COM CASACO DE PELE DE FOCA, COMO DEIXOU PIMENTA FORA DO AUTOCARRO E, COMO POR FIM, ABANDONOU O VITÓRIA POR NINGUÉM SE DECIDIR A DAR-LHE UM CONTRATO...

Fora um jovem treinador que assumira o risco.

Manuel José, depois de três épocas no Sporting de Espinho, ousou aceitar o risco. Assumir a equipa que fora de Pedroto, recolhendo os frutos deixados pelo Velho Mestre, qualificando-a para a Europa 13 anos depois, graças a um extraordinário quarto posto.

Um feito fantástico, mas que, logo de seguida, teve o gáudio substituído pela estupefacção: o Vitória iria ter de recorrer ao mercado para encontrar um novo técnico, pois, apesar do apuramento uefeiro, Manuel José não ia continuar ao serviço dos Conquistadores.

A verdade é que os problemas já vinham de longe. Como o próprio referiu em entrevista ao jornal Expresso de 22 de Julho de 2018, apesar do êxito, viu-se envolvido numa série de problemas, desde logo " a guerra de primos. Só me tocavam filmes destes. O primo era Armindo Pimenta Machado, um industrial com muito dinheiro, que foi sempre super simpático comigo, não tenho nada de mal a dizer dele, só não gostava que ele fosse para o banco comigo. Ele era o chefe do departamento de futebol, era vice-presidente e ia para o banco comigo." Armindo, que segundo o próprio, enquanto o treinador ia de fato de treino para o banco de suplentes, ele "ia de casaco de pele de foca, que custava um dinheirão. Eu ria-me, às vezes brincava com os jogadores: “Só falta levar uns peixinhos para dar à foca. Mas foi sempre simpático e oferecia dinheiro aos jogadores."

Porém, apesar destes pormenores, obviamente, que não seriam eles a razão da sua partida, depois de ter feito história. Não obstante isso, assinala-se, desde já, o carácter forte do treinador algarvio, capaz de apear o presidente do autocarro por este se atrasar, como o próprio conta: "- Jogávamos em casa fazíamos estágio em Esposende e um dia ele pergunta: “Ó Manuel José, a que horas é que vão para Esposende?”. Isto era numa sexta-feira depois do treino. “Amanhã vamos treinar às 10 horas, deixo os jogadores ir almoçar a casa, às três horas da tarde toda a gente aqui, e vamos embora”. E ele: “Então eu vou convosco”. E eu: “Ó doutor, eu dou uma margem de cinco minutos, quem não estiver, inclusive eu, fica em terra”. E ele: “Não se preocupe”. Três horas e cinco minutos e o nosso amigo Pimenta Machado não estava lá. Digo para o chofer: “Vamos embora”. Depois de jantar apareceu no Hotel do Pinhal, em Esposende, e nem sequer tocou no assunto."

Também, seria por essa especificidade de carácter que tomaria a decisão de abandonar o Vitória. Com efeito, após duas reuniões com o líder da direcção, onde tudo parecia ter ficado acertado para a sua renovação, a verdade é a passagem do acordo para o papel ficava sempre "pendurada" por causa de um ou outro resultado menos positivo.

Fruto dessa indecisão, o treinador terá feito um ultimato ao líder máximo do clube, algo que com Pimenta não costumava dar bom resultado. Assim, "Às tantas vi que íamos ter dois jogos seguidos fora chatos e depois tínhamos o FC Porto, em casa, com o José Maria Pedroto. Jogávamos na Póvoa contra o Varzim, que estava a fazer uma época excelente com o José Torres como treinador. Ele apareceu, esteve lá connosco e por volta da meia-noite peço-lhe cinco minutos. “Ó doutor já percebi que estou a ser julgado pelos resultados. Estou aqui há seis meses, vim substituir o José Maria Pedroto, que é um ícone dos treinadores em Portugal, e o doutor já teve tempo de perceber se tenho ou não capacidade para treinar o Vitória. Os resultados têm sido bons até agora e o senhor está a julgar-me por resultados menos bons. Agora vamos jogar dois jogos seguidos fora, o Marítimo que está para descer de divisão, o Varzim está a jogar muito bem, portanto vai ser assim: depois desses dois jogos vai ter de decidir se quer que eu continue ou não."

Antes da viagem para esse jogo com o Funchal, o treinador terá recebido um telefonema de Joaquim Rita, jornalista de A Bola, que ter-lhe-á confidenciado, que o Portimonense pretendia oferecer-lhe um contrato de quatro anos. Ainda como treinador do Vitória, terá tido uma reunião com o líder dos algarvios, acordando termos com este mas sempre subordinando um futuro compromisso à decisão de Pimenta.

Dias depois dessa partida, António Mendes, o chefe do departamento de futebol, terá pedido ao treinador para esperar pelo final do jogo seguinte perante o FC Porto, o que o técnico não terá aceite, pois “Ele continua a dizer para esperarmos pelo jogo do FC Porto”. Ele continua a julgar-me por resultados? Então está bem." Telefonaria para o Algarve para informar que aceitava ser o novo treinador do Portimonense, onde esteve, apenas, duas temporadas para partir, posteriormente, rumo ao Sporting.

Contudo, esta história terá tido um derradeiro episódio. Já com o apuramento europeu no bolso, no derradeiro jogo da temporada que se antevia de festa no, então, Municipal, frente ao Portimonense que iria ser o seu clube na temporada seguinte e já com Stessl a chegar a Guimarães, seria alvo de uma tentativa desesperada para ficar no Berço da Nação por parte de António Mendes que disse-lhe que "temos aqui um contrato com Stessl mas é a si que nós queremos, assine aqui o contrato”. E eu: “Então o homem está a chegar ao aeroporto...” E ele: “Ele chega aqui amanhã, vê um jogo, come um bom almoço, bebe vinho português, que ele gosta, e vai lá para a Áustria que nós não precisamos dele para nada”.

Não aceitaria esta derradeira tentativa de sedução e abandonaria os Conquistadores! O austríaco tornar-se-ia treinador do Vitória, mas sem o sucesso de Manuel José... nem de perto, nem longe!

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