Estávamos na temporada de 1963/64...
O Vitória, orientado pelo argentino José Valle, andava na parte alta da tabela, imiscuindo-se na luta pelos primeiros lugares, o que, obviamente gerava grande entusiasmo em todos os adeptos., dispostos a acompanhar a equipa para toda a parte.
Ora, tratando-se da deslocação sempre aprazível à Póvoa de Varzim, ainda mais. Na verdade, como escreveu o Notícias de Guimarães da data de 23 de Fevereiro de 1964, "os vimaranenses são useiros na demanda da Póvoa do Mar. Habituaram-se a tanto, quase por desígnio familiar, transmitido de pais a filhos. Famílias há, da nossa terra, que já para lá vão desde o tempo dos seus avoengos. Porque a praia é agradável? Talvez. Porque fica a jeito? Talvez, mais ainda. Mas, principalmente, porque as gentes da Póvoa sempre nos receberam afectuosamente solícitas, com cordialidade. Bem sabemos que quando lá vamos na qualidade de veraneantes, tudo pagamos a peso de oiro, deixando-lhes ficar abonados proventos. Mas negócio é negócio, não se compare com sentimentalismos."
Porém, nesse Domingo de Fevereiro, esses sentimentos de afecto não existiram. Com efeito, nas bancadas as duas falanges de apoio envolveram-se em confrontos, enquanto dentro do recinto de jogo, a própria equipa varzinista fez da partida "um acto de vida ou de morte, onde um triunfo das suas cores seria glória que jamais feneceria. Se os seus jogadores, por si, tiveram a noção quase exacta do melhor desportivismo, a sua falange apoiaste perdeu o senso, transformou um jogo de bola em questão de honra alheira do conceito. A gritaria infernal a reclamar por tudo ou nada, o enxovalho inoportuno, a agressão até, tomou cariz contradizendo com a costumeira afeição que os poveiros prodigalizam aos seus frequentadores de Guimarães."
Com um ambiente tão incendiado, a equipa composta por Roldão; Caiçara, Freitas; João da Costa, Manuel Pinto, Virgílio, Castro Teodoro, Rodrigo, Peres e Mendes, teve tarefa árdua. Na verdade, "sempre com vantagem no marcador, desfazendo prestes cada empate que o Varzim consumava, os vimaranenses alardearam uma capacidade condizente com a fama que gozam", numa verdadeira montanha russa de emoções...e de golos.
Senão, atentemos:
Golo do Vitória - (0-1) Mendes - 11 minutos;
Golo do Varzim - (1-1) - Rogério Dias - 21 minutos;
Golo do Vitória (1-2) - Mendes - 24 minutos;
Golo do Varzim (2-2) - António Jorge - 29 minutos;
Golo do Vitória (2-3) - Rodrigo - 44 minutos;
Golo do Varzim (3-3) - Fernando Oliveira - 56 minutos;
Golo do Vitória (3-4) - Caiçara - 59 minutos;
Golo do Vitória (3-5) - Teodoro - 79 minutos;
Golo do Varzim (4-5) - Salvador - 89 minutos.
Absolutamente impróprio para cardíacos... E assim, considerou-se que "a partida rodeou-se de agrado, ao jeito de ouvirmos e lermos, que foi o melhor jogo disputado na Póvoa, na época decorrente. Ora já lá tinham, nesta temporada, o Benfica, o Sporting, o Porto e o Belenenses...”
Assim, na memória ficaram "os golos do encontro, como base essencial do espectáculo, onde os houve de todas as formas e feitios, para sobressair, dentro deles, aquele tiro de canhão de Caiçara, a mostrar às gentes do mar a potencialidade vimaranense."
E como certeza restava, que apesar do sucedido nas bancadas, "para o Verão, os vimaranenses lá estarão de novo, prazenteiros e despreocupados, gozando a maresia, distraindo-se com os sucos nos bares da praia ou fazendo picadeiro mais ou menos amoroso na Avenida dos Banhos. Esquecerão os enxovalhos recebidos, atribuindo à novidade que é, para as gentes poveiras, a I Divisão Nacional." A Póvoa continuou, pois, a ser refúgio de eleição para a maioria...