AQUELE JOGO DE COIMBRA, FRENTE AOS BELENENSES, A ABRIR AS PORTAS PARA O JAMOR...

Terá sido, provavelmente, uma das mais belas páginas dos cento e um anos de história do Vitória. Uma página de bravura indómita, de épico heroísmo para a equipa orientada pelo argentino José Valle.

A história conta-se em breves mas emocionadas e deliciosas palavras. Depois de um campeonato de 1962/63 tranquilo, longe dos sustos de descida da época antecedente, o conjunto vitoriano encetou a sua participação na Taça de Portugal, que, por esses anos, tinha as suas eliminatórias decisivas depois do campeonato findar. Na verdade, o Vitória, antes da liga maior do futebol português ser iniciada, já tinha eliminado o Sporting da Covilhã, o que lhe permitiu depois, já em Junho do ano seguinte, encontrar a Académica nos oitavos de final da prova que eliminaria.

Seguiu-se nos quartos de final a União de Madeira, que apesar da derrota na Pérola do Atlântico foi ultrapassada com uma goleada por cinco bolas a zero na Amorosa, já que as eliminatórias disputavam-se sempre a duas mãos, para se marcar encontro nas meias finais frente ao Belenenses, com o sonho de conhecer o Jamor bem vivo.

Porém, na primeira mão da eliminatória disputada no Restelo nada correu bem ao Vitória. Seria derrotado por duas bolas a zero no recinto dos homens da Cruz de Cristo, o que obrigava a que, pelo menos vencesse por dois tentos em Guimarães, para permitir a realização de um terceiro jogo, o de desempate. Seria uma partida plena de sofrimento, com o adversário a adiantar-se no marcador, o que parecia indiciar que o apuramento para a final da Taça de Portugal era impossível. Porém, o futebol é feito de momentos marcantes e os golos de Caiçara e de Lua abriram uma janela de esperança, que Peres, no último minuto da contenda, tratou de confirmar. O Vitória reservava-se ao direito de sonhar num jogo de desempate.

Neste, disputado em Coimbra, por ser a meio caminho para ambos os intervenientes, o Vitória terá dado uma das maiores provas de resiliência da sua longa história. A alinhar com Roldão; Caiçara, Manuel Pinto, Silveira, Daniel; Virgílio, Paulino, Peres; Lua, Mendes e Armando, os Conquistadores cedo ficaram em desvantagem no marcador. Mais do que isso, desperdiçaram uma grande penalidade, tiveram um golo anulado e o capitão e líder da equipa, Silveira, a ter de sair lesionado numa altura em que não existiam substituições. Pior, não poderia ser!

Mas, a equipa vimaranense viveria, no final da partida, os sete minutos mais belos da sua história! Empolgantes! Frenéticos! Graças ao "sacrifício de todos os gigantes, gigantes cuja força de ânimo chegou para tudo: para desprezar o infortúnio e perseguir a vitória até ao último momento e para disfarçar a golpes de energia a enorme desvantagem de um dos seus homens, logo o experiente Silveira pedra-base da sua defesa."

Na verdade, naqueles minutos feitos "de raiva de quem não aceita o destino evidente, porque o sente injusto e luta contra ele opondo uma força maior a uma força muito grande" , os golos de Peres, Lua e Mendes foram o sinal de uma equipa que se revoltava contra o destino, que tudo fez para que ele pudesse ser alterado. No final, o três a um conquistado sobre a linha de meta "foi regado a lágrimas, lágrimas que correram pelos rostos dos jogadores, pela face dura do Técnico, que caíram nas bancadas, que rolaram na cabine, molhando sempre o nome do Vitória e de Guimarães, murmurados pelo coração."

A chegada a Guimarães, essa, foi apoteótica, inesquecível... "Quando a caravana, composta por caminhetas e automóveis que se estendia por mais de um quilómetro de extensão, começou a entrar na cidade, o calor vitoriano começou a intensificar-se cada vez mais, para chegar ao rubro quando os atletas se aproximaram do Toural, onde não se podia dar um passo, tal era a enchente que ocupava todos os espaços.

Havia lágrimas de contentamento. Todos pretendiam abraçar e testemunhar aos atletas o seu reconhecimento por tão grande feito.”

Na final, no Jamor, que a fotografia retrata, com a equipa fatigada pelo esforço realizado quatro dias antes e desfalcada, o Sporting triunfaria sem dificuldades. Mas, aquele jogo de desempate deverá entrar directamente no rol das mais belas memórias da história vitoriana!

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