Estávamos no ano de 1923.
Ainda no Campo da Atouguia, o Vitória dava os primeiros passos no desporto-rei, procurando encontrar oponentes que permitissem aos seus atletas aperfeiçoarem as suas capacidades.
Assim, em Junho de 1923, a equipa vimaranense recebeu os aveirenses do Vista Alegre, numa partida em que o Semanário A Razão deu nota na sua publicação de 24 de Junho desse ano. Refira-se que o jornal mencionado já tinha uma coluna denominada de "Crónica Sportiva", que naqueles tempos era uma inovação de realçar, atendendo ao facto do desporto não merecer o relevo dos dias de hoje e nem sequer existir qualquer publicação dessa índole.
Porém, como escrevemos no título, seria uma partida polémica, já que a equipa da casa triunfou graças à desistência do adversário, não obstante "os rapazes do Victoria apresentaram-se numa forma magnífica, mostrando bem o valor que virá a ter este team quando bem treinado em conjunto."
Mas, "...perante a energia, ainda que correcta, dos homens do Victoria, deram uma triste ideia da sua educação desportiva, abandonando o campo, sem sequer esperar a decisão do árbitro..." sobre o caso que lhes causara insatisfação. Este passou pela indignação por causa de uma carga do vitoriano Artur ao guardião adversário, que levou a que o adversário aveirense deixasse o recinto. Abandono esse que causaria grande polémica, pois um jornal sediado em Aveiro, o Beira-Mar, escreveria que a equipa fê-lo em massa, quando a publicação vimaranense aqui consultada, afiançou que a mesma "...foi feita à formigo e com o protesto de alguns dos jogadores do Vista-Alegre."
Tal levaria a uma outra curiosa troca de argumentos, com um jornal, curiosamente, também, vimaranense, o Comércio de Guimarães que defendeu que tal acto impediu que este conjunto triunfasse na partida, enquanto o referido A Razão contrapunha que "...os rapazes do Victoria mostraram-se muito enérgicos e muito leaes (sic) e só a molesa (sic) dos seus adversários, molesa que chegou a ser enervante, foi a causa do abandono do campo." Para deitar mais achas parar uma fogueira que já ardia intensamente ainda era questionado "que fariam eles se lhes ficasse inutilisado (sic) como ficou Serra?"
Numa verdadeira escalada de palavras e trocas de acusações, a Razão de 10 de Julho de 1923, dava conta que um jornal de Ílhavo catalogou a partida como "... uma autêntica caça ao homem!!! e os nossos jogadores são apresentados como verdadeiros canibais." Como reconhece o periódico consultado, tal seria capaz, apenas, de ser encarado "... só à gargalhada...".
Porém, as supostas falsidades iriam mais longe, ao acusarem que um jogador da sua equipa estivera muitos minutos estendido no terreno a clamar por assistência. Contudo, "Houve realmente um jogador que esteve durante uns momentos estendido no campo, mas esse jogador que é o 1º Sargento Serra pertencia ao grupo do Victoria. Assim é que está certo."
Num verdadeiro chorrilho de mentiras, o jornal aveirense haveria de escrever que o capitão-geral do Vitória, de nome Dantas, pedira desculpas pela atitude dos seus colegas de equipa a um jogador da equipa adversária. Escrevia o jornal, todavia que "Tivemos a satisfação de ouvir o sr. Dantas dizer-nos que aquilo não era verdade, pois nunca ele foi pedir ao grupo da Vista Alegre desculpa pelas violências dos jogadores vimaranenses."
Por isso, era feito um apelo para "... que as agremiações sportivas vimaranenses nunca mais dêem ensejo a que grupos que nos visitem se possam queixar da maneira fria como foram recebidos."
Era uma das primeiras grandes polémicas em que o Vitória se via como interveniente... ainda que, como em tantas outras vezes, tivesse de lidar com a mentira destinada a tirar-lhe a razão.